APRESENTAÇÃO

“A TERRA DE QUE A GENTE GOSTA” é expressão que nos agrada. É sentida e é profunda, e é adotada como a ideia força de “TomarOpinião”.

Pretendemos oferecer críticas construtivas e diversificadas sobre os valores, as coisas e as atualidades da nossa terra, e não só. Pretendemos criar um elemento despertador de consciências e de iniciativas de cidadania, e constituir uma referência na abordagem descomprometida desses valores, dessas coisas e dessas atualidades.

Queremos, portanto, estimular o debate, de temas e de ideias, porque acreditamos que dele podem resultar dinâmicas de cidadania, que alicercem mudanças que por certo todos aspiramos.

“TomarOpinião” será um blogue de artigos de opinião e um espaço de expressão livre e responsável, diversificada e ampla.

tomaropiniao@gmail.com


sábado, 30 de abril de 2016

EU NÃO GOSTO DE ÁGUA


  
Carlos Carvalheiro 

 Eu não gosto de água. Do sabor, entenda-se. Por isso nunca bebo água. À exceção de um copinho de água por ano na nascente dos Pegões, antes de começar a “demanda” dos bolinhos, nos Brasões, no 1º de novembro.

  Mas como um blog sério como este em que aceitei colaborar definiu para tema de abril a água, não sei se por causa do “abril, águas mil”, eis-me aqui a desviar-me do triângulo mais “alavancador” que nos rodeia chamado Nabão, Zêzere e Tejo e a focar-me no negócio de milhões que, quando começou, me pareceu o mais improvável do mundo: a água engarrafada. Por aqui se vê o que eu percebo de negócios, pelo menos no que toca a ganhar dinheiro.
  Em praticamente todo o mundo a sul do Trópico de Cancer, um dos fatores de não desenvolvimento é a falta de agua canalizada. Uma comunidade que tem uma fonte, tem um tesouro.
  Em Tomar, a Fonte da Prata, que ficava ali onde é hoje a rotunda na ponte nova, era local de calhandrice. Quando foi estreado, em 1979, o espetáculo “Fatias de Cá com Nini Ferreira” onde se recriaram quadros de revista à tomarense dos anos 30 a 50, lá estava isso retratado.
  E então, até ao 25 de abril, as pessoas iam às fontes buscar água nos cântaros, mesmo quando já tinham água canalizada, porque achavam a água mais saborosa, tendo umas fontes mais nomeada que outras, como era o caso da da Asseiceira ou da de Marmelais (hoje em dia com uma placa —das pequenas, não das grandes— a dizer “imprópria para consumo”, que tristeza, embora a mim de pouco me sirva a informação, que nem que fosse “própria” eu a bebia…).
  Claro que as águas mais famosas do país eram as “minerais” do Luso ou do Vidago e as gaseificadas Carvalhelhos ou Pedras Salgadas. Também havia as das termas, boas para a saúde mas um bocadinho mal cheirosas, não se pode ter tudo. Mas estas nunca se venderam em garrafas. Ao menos que eu saiba. Quem queria águas das termas, tinha de para lá ir fazer os tratamentos. As outras eram vendidas em garrafas de vidro. Até que, neste últimos anos, apareceram as garrafas de plástico e começou um negociozorro: água engarrafada das mais variadas proveniências. E as pessoas passaram a comprá-la aos garrafões e a andar com garrafinhas na mão a bebericá-la. E o velho copo de água deixou de ser usual.
  E assim se passou a vender um produto que a Natureza nos dá e os serviços municipalizados nos fazem chegar a casa para tomar banho e lavar roupa e loiça mas, para beber, toca a beber da garrafinha, que custa tanto como a bica, o que dá mais de 2€ por litro, chegando a custar o dobro ou o triplo em estações de serviço ou em esplanadas armadas ao pingarelho.
  Coitado do Barrela, se ainda hoje andasse a vender água da Asseiceira numa carroça com cântaros, como o fazia nos anos 60. Distribuía a água por diversas casas em Tomar e o negócio corria bem. Ao menos uma vez, tendo vendido toda a água, e para não perder tempo a voltar à Asseiceira para reencher os cântaros, vai de os encher na fonte de S. Lourenço, à saída de Tomar. Foi apanhado. Por isso, quando passava com a sua carroça cheio de cântaros ouvia do passeio “Queres ser rico?”, ao que o Barrela, fazendo o tchh-tchh com a boca, dizia: “Anda macho… anda cabrão…”.




sexta-feira, 29 de abril de 2016

CONGRESSO DA SOPA OU MIXÓRDIA DA CONFUSÃO?

  Mário Cobra

   Podem existir sadismos encobertos capazes de deduzir vanglórias num amontoado de comensais a correrem para uns caldeirões de sopa e ali ficarem repimpados até saciarem a desmedida gula. Os que vieram atrás se lixem, empurrem, comam relva. Os mais resolutos, beiços lambuzados de bagunça, não largam os entulhos enquanto não rejubilam “Já comi 18 sopas” “Já comi 46”, “Já comi 224”, “Já engoli um caldeirão”, “Gostei mais foi da sopa de corno”. Talvez fosse mais prático ordenar a fila como dever ser (congresso da sopa sem filas é como o Mouchão sem flores) exemplo de um separador em corda obrigando a um pequeno corredor, ao correr das coxas, onde os comensais tenham de aceder aos caldeiros de forma ordeira, sem a confusão do ajuntamento. Complicado?   
    Nos anos já mais passados deste frenesim do congresso, os participantes faziam fila desde a ponte. Os primeiros permaneciam ali desde as 10h00, desespero de serem a vanguarda, torrando a mona ao sol, de pé, soberbo exemplo de tortura por simples mixórdia de couve com feijão para ajudar a festa. Ao meio-dia em ponto, o árbitro apitava para o início da disputa, abriam a cancela e os sôfregos disparavam accionados por molas impulsivas do deixa-me encher a mula antes o mundo acabe. Às sugestões de que seria mais urbano a malta ir entrando para o Mouchão logo que chegasse, evitando assim as filas, as respostas dos responsáveis traduziam-se naquela imposição de serem eles a decidir, eventualmente ufanos por assistirem ao espectáculo das filas. Agora não será tanto assim porque o masoquismo também cansa e o pessoal foi desistindo.  
   Entretanto, sempre anunciado que os lucros do congresso revertiam para o CIRE, entregue o cheque com pompa e circunstância em reunião do executivo, veio a saber-se - afinal o certame dava prejuízo. Milhares de pessoas pagavam bilhete caro e mesmo assim o festim dava prejuízo. Nada relevante caso se atenda a que uma das festas de tabuleiros com meio milhão de visitantes deu fortunas de prejuízo. Lucro nem sequer se admite que dê. Será melhor não se falar disso para não se estragar a folia que tanto orgulha o deprimido burgo.   
   Já agora, se a autarquia não necessita de lucros nos eventos de massas, não entende como, por exemplo, não dispõe de meia dúzia de euros para reparar o parque infantil, certamente útil a quantos nos visitam no congresso da sopa a fim de entreterem os filhos enquanto aguardam a abertura do conflituoso regabofe. No dia 25 de Abril, por exemplo, ouviam-se remoques de grupos de visitantes confrontados com o parque infantil encerrado “ É isto uma cidade turística?”, “Quem viu esta cidade e quem a vê agora”.
    A essa hora, decorria a sessão solene da Assembleia Municipal alusiva ao 25 de Abril certamente com as forças do executivo a apregoar loas de “Viva o 25 de Abril”, “Viva Tomar”. Faltou dizer “Viva o parque infantil encerrado”. A verba despendida nas subvenções aos autarcas pela participação na cerimónia daria para reparar o parque.
            Que o consommé lhes faça bom proveito.


quarta-feira, 27 de abril de 2016

A ÁGUA E TOMAR

  
 António Alexandre 

 A água ganhou no mundo uma enorme importância e em Tomar o Rio Nabão, teve e tem uma influência decisiva para fixação das pessoas e crescimento da própria cidade.
Todas as indústrias que aqui se instalaram ao longo do rio, a central elétrica da levada que permitiu a Tomar ser uma das primeiras cidades com iluminação elétrica, bem como a Barragem do Castelo de Bode, primeiro para a produção de eletricidade e mais recentemente para levar água a uma vasta região que vai de Tomar à grande Lisboa, que antes não a tinha em qualidade e quantidade.
Tomar beneficiou desde sempre de ter água para se desenvolver e crescer, seja ela dos seus rios Nabão ou Zêzere, mas também das suas várias nascentes com destaque para o Agroal e a Mendacha (Sabacheira).
Coisa diferente foi a gestão da água no final do século XX e inicio do XXI.
Quando muitos concelhos resolveram as suas questões de abastecimento  de água e saneamento do seu território, em Tomar a par de um certo falhanço da gestão municipal, quanto ao saneamento, dificilmente poderia ser pior. Mesmo mais investimentos avultados das Águas do Centro em água e saneamento, poderiam ter sido realizados, mas pela inércia autárquica não o foram.
Verdade se diga que a culpa terá de ser dividida em parte pelos governos do país, pois a somar a uma incapacidade e ausência de vontade própria do município, se juntaram todos os vários governos de Portugal, que nos últimos 15 anos construíram um modelo que impediu alguns como Tomar, de se candidatar a verbas da comunidade para esta área, que nos levou a uma situação desastrosa, pois temos pouca cobertura de saneamento, de que zonas perto da cidade como Carvalhos de Figueiredo ou Palhavã são uma amostra real do falhanço de vários mandatos do município.
Existem no entanto bons exemplos de outras formas de gerir estes sectores e as Águas do Ribatejo aqui tão perto, são um desses exemplos.
A água de abastecimento e saneamento, deve ter uma gestão empresarial e autónoma da politiquice, bem como da gestão diária de autarcas sem vontade de fazer e interesse em saber fazer. Os SMAS devem ter uma gestão interessada e ativa, o atual modelo não nos leva a bom caminho e muito menos a sua integração total na gestão do município.
Esta questão tem de ser vista pela qualidade/preço, mas pela cobertura territorial. E não como forma de financiamento do município para outras áreas.
É no entanto necessário lembrar que em 1990 na cidade de Tomar se fechava a água ás 22,00 h e se ligava ás 6,00 h pois não existia em quantidade, tal como na maioria das freguesias nem abastecimento tinham. E quanto a tratamento de esgotos era quase zero em todo o concelho, incluindo a cidade.
Mas isso não justifica o que não se fez, ou o que mais se poderia ter feito, pela tal qualidade/preço.
Tal como em muitas outras coisas, Tomar não fez o que devia para as aproveitar, outro exemplo é o aproveitamento turístico e lúdico da água no nosso concelho, ficou pelo faz de conta que somos, mas não somos na verdade, bons gestores de todo o nosso potencial.

segunda-feira, 25 de abril de 2016

A ÁGUA QUE ESTAMOS A METER...

António Lourenço dos Santos

…no preço dela, já que pagamos dos preços mais elevados do País, muito em especial desde há 2 anos, quando a Senhora Câmara aprovou mais um aumento, próximo de +25%. Mas foi como nada se tivesse passado. O silêncio reinou e continua a reinar. Tudo parece estar bem no Reino da Agua e dos respetivos SMAS …

…na forma como (não) tratamos o Nabão, cujas águas deslizam, literalmente, ao sabor da corrente. Sendo o Rio um dos elementos que mais contribui para a imagem da cidade, e que muito a valoriza, está desaproveitado e pouco ou nada tratado. Vai vivendo, vai passando, vai escoando. Sem aproveitamento nem valorização, com lixo e assoreamento, ..., a caminho do Zêzere…

…na travagem do declínio do Concelho, devido à ausência de medidas positivas, concretas e coerentes, para atrair Empresas e Investimentos e para criar Emprego. Há quem não entenda que decisões como um aumento exagerado do preço da água, ou que situações como o travão teimoso que existe nalguns serviços camarários na apreciação de projetos, não tenham importância. Ou que o assumido desinteresse da Presidência da Câmara em iniciativas de enquadramento e incentivo à internacionalização das empresas tomarenses, seja inócuo. Deve ser porque não há declínio…

…na melhoria da competitividade do Concelho. Em tabela há pouco publicada no Jornal de Negócios, Tomar continua a ganhar posições, infelizmente no sentido da queda. Há 2 anos, ocupava a posição 54. Em 2015, já tinha caído para a posição 73. Este índice, que mede a atratividade do concelho para viver e desenvolver atividade, está pleno de roturas na canalização…
…no abandono a que estão votados o ordenamento e o arranjo da Cidade, onde proliferam sujidades, derrocadas, abandono de população, crise do comercio, passeios-jardins e passeios-hortas, jardins sem passeios e jardins sem hortas. Quem se quer atrair para uma cidade suja? Que se espera?....  
…na reorganização da orgânica e das funções da Câmara, que é e será sempre o elemento motor da promoção do Concelho e do seu desenvolvimento. As Câmaras municipais são hoje em dia agentes da mudança. E se não o forem, não há mudança nem progresso, há estagnação ou declínio. São opções livres…enterrar a cabeça na areia, ou assumir novas atribuições e novas responsabilidades, com ambição…?  

…na assistência à Saúde, pelo estado deplorável a que chegou a assistência corrente no Hospital. Horas de esperas, desesperos de impotências, reformas inacabadas, decisões sem sentidos, lassidão e inoperância. Alguém compreende a orgânica do Centro Hospitalar do Médio Tejo…?

…no aproveitamento do Portugal 2020, que foi abandonado ou tem sido ignorado pela Câmara. Há oportunidades concretas que estão a ser desperdiçadas. É incompetência, ou apenas incapacidade…?

terça-feira, 19 de abril de 2016

ESPARTILHAR NA ÁGUA

Mário Cobra

 Vamos lá então a uma lambuzadela sobre o tema da nossa caríssima água. Caríssima porque cara. Para os deístas, Deus, supremo criador, certamente formou os rios. Talvez porque deísta, um dos nossos recentes autarcas tomarenses, perante a passagem à situação de pensionista do último guarda-rios, terá decidido “Se Deus criou os rios, pois Deus que os limpe”. Assim foi extinto o cargo. O rio Nabão ainda não foi extinto. 
  Recuando a aguados primórdios, na opinião dos crentes o banho original terá sido tomado pelo Adão e Eva, decerto nus, ainda não existiam vestes nem comissões de censura. Andando que temos de ir fazer o almoço, a água já está aquecer no fogão, ao longo dos séculos e séculos ámen Jesus a água dos rios e dos poços foi regando sementeiras, lavando bochechas. Construíram-se represas, azenhas. Por volta de 1160, mais coisa, menos coisa, por cá D. Gualdim Pais subiu o morro, olhou o rio e disse “Vamos aqui tomar um banho”. Podia ter sido a origem do nome da cidade. Pelo visto, não foi. Vai daí os Templários mandaram construir um castelo e certamente o pessoal dedicou-se à pesca. Então o peixe sabia a peixe. Além das cavalgadas templárias, acreditamos que então existissem as caldeiradas templárias. Adiante que a água já está a ferver no tacho do almoço. Mais açudes, mais artefactos, mais banhos no rio, anos 50 do século passado a barragem do Castelo do Bode valorizou a retenção da nossa água, neste caso do rio Zêzere, fluindo a produção de electricidade. No final dessa década, sabe-se lá por que carga de água, foi necessária uma manifestação para impedir que o precioso líquido da nascente do Agroal fosse desviado para a abastecer Fátima. Admita-se que roubar um rio seria então tão insólito como agora prever a falência do BES por falta de liquidez. Entretanto, os poços da Mendacha foram e são manancial no florescer do abastecimento de água ao domicílio. 
 Vai daí ao caso, agora a água está caríssima, assim como a energia eléctrica. Os Serviços Municipalizados de Tomar obtiveram lucros superiores a 500 mil euros em 2015, pagando os munícipes das águas mais caras do país, assim como a EDP previa lucros de 900 milhões. Assim sendo, a água é uma boa mina, é só os serviços abrirem a torneira dos preços.
  Entrementes, a água borbulha no tacho, vamos cozer as batatas e uma posta do cherne da questão. Também há o vinho. Não se esqueçam de lavar sempre as mãos antes das refeições e depois de tossicarem por causa das gripes.
              

sábado, 16 de abril de 2016

A FABULOSA FAUNA AQUÁTICA DE TOMAR

 Rui Ferreira


 Serpenteando por uma idílica paisagem verdejante, o rio Nabão encerra mistérios que apenas os naturalistas mais experientes podem aquilatar. As suas águas duras, que desde a Serra de Ansião vão solvendo as rochas jurássicas, chegam calmas a um vale outrora pantanoso. Aqui vivem várias espécies de animais. 
  Ao olhar mais distraído surgem espontaneamente os castores, as lontras e os peixes. Estas são as principais espécies e, portanto, os atores desta fantástica história.
  Durante séculos, castores e lontras têm disputado o poder no Nabão. Os peixes, uns maiores outros mais graúdos, vivem do que apanham a boiar, lutando encarniçadamente por algum naco de alimento, sofrendo com o estio no caudal do rio, condenados à sua condição aquática, abrindo e fechando a boca, como se comer e respirar fossem a mesma coisa.
  Os castores são um género de roedores cujos incisivos ganham uma cor alaranjada. Detestam ser apelidados de ratos de água e rejeitam qualquer comparação com os seus primos do esgoto ou dos campos. A principal ocupação dos castores é construir. Têm tanto empenho nisso que chegam mesmo a destruir para a seguir fazer a sua obra. É a sua natureza. 
  As lontras, por seu lado, têm um modo de vida mais descomprometido. Ao contrário dos castores, não são monógamas e aproveitam qualquer buraco para fazer ninho. Não são construtoras, gostam mais de passar o tempo em atividades lúdicas, como a natação artística, assobiar ou mesmo cantar. Também as lontras escondem um segredo: são primas das doninhas.
  A nossa história vai encontrar os bichos nabantinos reunidos junto a uma ilha do rio. Tinham passado 52 luas e os peixes, cansados de tanto tronco cortado, tanta represa e tanta confusão, ficaram emocionados com os assobios graciosos das lontras e escolheram nadar para a margem esquerda. Este era, já há muitos anos, o modo como os peixes escolhiam os seus soberanos. Nadavam desvairadamente para uma margem ou para outra. Desta vez, ganharam as lontras. 
  Nos montes, junto aos regatos dos pinhais, as doninhas festejavam com escaravelhos suculentos. As ratazanas, iradas, refugiavam-se nas tocas húmidas onde tinham guardado alguns mantimentos.
  A maioria dos peixes tinha rumado à margem esquerda, não só por estar cansada dos castores, mas também porque as lontras, do alto da ilha do rio, lhes tinham dito que iriam resolver o problema dos lagostins! Como todos sabemos, as lontras adoram lagostins. O lagostim, apesar de ter uma casca dura, sempre é mais acessível que o berbigão ou a amêijoa, cuja casca tem de ser partida com ferramentas. Acontece que os peixes andavam incomodados com os lagostins e certos barbos gritavam mesmo, a guelras abertas, tratar-se de uma infestação!
 Os castores, com tanto engenho e arte, nunca conseguiram resolver o problema e os lagostins, coitados, encravados entre a terra e a água, apenas conseguiram que os castores lhes oferecessem uns troncos de madeira. Pudera! Com dentes daquele tamanho, também eu arranjava troncos, pensou o velho lagostim do bigode.
  As lontras, uma vez no poder, cantaram em uníssono um hino, misto de assobios e gemidos de satisfação. Os peixes que tinham nadado para a margem esquerda ficaram entusiasmados. Algumas bogas e bordalos comentavam entre si que agora, com o rio mais limpo, poderiam nadar tranquilamente sem serem incomodados com os paus aguçados e a água turva dos castores. 
  Porém, a sorte dos peixes nunca é grande. As lontras do Nabão, além dos carreiros nas ervas, só sabem marcar o território com pequenos dejetos, colocados estrategicamente em pontos altos. As suas mãos têm barbatanas escondidas e não garras. A sua imagem de marca é a rapidez e a graciosidade, não a eficácia. Por isso, como o assunto dos lagostins nunca mais tinha saída, alguns velhos barbos fizeram um ultimato às lontras: Ou resolvem o problema dos lagostins, ou os peixes deixam de alimentar as lontras!
  No ninho das lontras a azáfama era sempre grande, são uns bichos que não conseguem estar quietos. Quando estão juntas têm a tendência de se morderem umas às outras. Não são mordeduras fatais, mas antes manifestações gregárias de autoridade. Claro que os peixes, mesmo tendo as orelhas pequeninas, debaixo de água, escutam tudo!
  Assim, o cardume pôs-se à escuta e, entre guinchos e mordidelas, ficou a saber que as lontras nunca iriam tratar do problema dos lagostins. Entretanto, a notícia espalhou-se. Toda a bicharada ficou ciente do logro das lontras. Os castores começaram imediatamente a afiar os seus paus, procurando mostrar serviço e não cuidando que, mais uma vez, a sua falta de graciosidade poderia ferir os peixes. 
  Um pato, sobrevoando o vale, tinha visto o rio, as margens, a ilha, os paus e as construções dos castores, os carreiros e as marcas das lontras e os lagostins encardidos na margem. Pousou junto aos peixes e disse: Amigos peixes, cada um acredita facilmente, no que teme e no que deseja.


quarta-feira, 13 de abril de 2016

AS NOSSAS FONTES

  António Pedro Costa

  É um facto, que Tomar e os seus rios estão inteiramente ligados. Pela caracterização que dão, e pelas potencialidades que nos oferecem. Indiscutivelmente temos o rio Nabão como elemento de maior destaque, pois trata-se do “sangue” vivo que dá vida a Tomar. Numa zona mais extrema do concelho, o nosso maior caudal de grandeza, o Zêzere, é hoje em dia um gigante que “adormece” quando passa pelo concelho. E falando em potencialidades - pois é demasiado óbvio que elas existem – tanto o Nabão como o Zêzere transbordam das mais diversas faculdades que nós podemos aproveitar.   Estamos num burgo profundamente exigente, mas também com uma profunda resignação, e, atreve-mo a dizer com alguma passividade perante tão boas propriedades que nos foram dadas pela Natureza. Sim, não foi ninguém que cá as meteu. 
  O rio que divide a cidade ao meio é um marco importante da nossa história, com um leito cheio de estórias para contar. É caracterizado pelos seus açudes, não com água cristalina, mas com uma “fisionomia” interessante, que ao chegar à ponte velha nos oferece uma paisagem bonita e faustosa. De uma coisa podem ter a certeza, ninguém nos tira esta preciosidade natural. Seria um crime, não referir aquela roda de origem árabe, junto àquela pequena ilha chamada Mouchão, que está em qualquer cartão-de-visita da cidade. No entanto, a despedida das margens do rio, atualmente, na zona do flecheiro é verdadeiramente triste. Enquanto o rio vai embora da cidade, quem chega pela zona sul depara-se com o lixo amontoado que fica preso num velho açude, desaparecendo o lixo apenas quando o caudal em tempo de chuva sobe. Que belo cartão-de-visita! Isto para não falar das margens daquele sítio, tristes e cinzentas. O rio não merece uma despedida assim da cidade. 
  Como já referi, o rio com a sua localização deve ser um ponto essencial na atração de turismo, e do seu verdadeiro aproveitamento. Todos os projetos já programados para o rio são muito bem-vindo, e devem ser devidamente equacionados pelos responsáveis políticos. O rio Nabão pela sua centralidade tem de ser um tema do debate político e não pode ser esquecido, como tende a ser. Não basta ordenar limpezas esporádicas das margens, é necessário encontrar formas de as potencializar. Obviamente, neste capitulo pelo menos tem que ser encontrada uma solução para o Flecheiro de modo a dar vida às margens do rio, e a garantir a sua preservação. Ao fim ao cabo, a água é o bem mais importante que temos no planeta. 
  O rio Zêzere é um exemplo de como o seu aproveitamento noutros concelhos por onde passa, contrasta com a quase passividade com que é encarado entre nós. Este desaproveitamento do Zêzere é uma história bem antiga. A pergunta é simples: o que fazer com o Zêzere? A resposta também: “usar e abusar”. É um ponto de convergência importante de todos os verões. Os banhos, os passeios de barco, as pescarias, e outros aproveitamentos de lazer, tornam o Zêzere um local de culto para ócio. Nem sequer uma singela praia fluvial temos, apenas e por enquanto ao papel ou à imaginação.  Concluindo, e acabando como comecei, Tomar deve aproveitar as potencialidades que a Natureza nos dá. É importante referir, que a nossa cidade, tendo o potencial natural enorme para o turismo que tem, não está dotada de uma visão estratégica onde figure o aproveitamento e a valorização do Nabão e do Zêzere, e das suas bacias.
  O tema “água” é para além de pertinente, um tema sério e reflexão importante.    

segunda-feira, 11 de abril de 2016

BOCAS

 Mário Cobra


     Cafetaria dezena de anos depois

A informação da autarquia segundo a qual a zona desportiva vai beneficiar de uma cafetaria com esplanada, talvez justifique a opinião de que o título melhor enquadrado deverá ser “Dezena de anos depois, cafetaria na zona desportiva”. Isto caso se fale da mesma estrutura prevista na obra do Polis, idos de 2005, tendo mesmo sido colocada a base em madeira, empecilho que ainda lá pode ser visto, indicador da instalação de uma cafetaria. Ou aquela base de madeira era só para recreio canino, como acontece com a barraca erguida no Mouchão e que ainda hoje a sua utilidade permanece como grande segredo autárquico. Seria para instalar uma rataria?  
Salvo melhor opinião, exemplo dos emaranhados autárquicos, da inépcia, das complicações, uma cafetaria na zona desportiva demora uma dezena de anos a anunciar, certamente mais uma dezena de anos a concretizar. 
  
      Fitofarmacêutica na cidade

  No congresso do PSD, José Eduardo Martins, ex-secretário de Estado do Ambiente de Durão Barroso, disse que o partido precisa criar incentivos fortes em áreas como a saúde ou o sector fitofarmacêutico. 
Pois que esse incentivo, que visa destruir partes de vegetais e reduzir ou impedir o seu crescimento indesejável, chegue a Tomar onde, assim se queixam os munícipes, abundam as ervas daninhas.

    Plano Nacional de vacuidades

Anunciado pelo governo de forma assaz mediática, o Plano Nacional de Reformas define prioridades tão vagas e óbvias quanto a qualificação dos portugueses, a transferência de conhecimentos entre as universidades e as empresas, a valorização do território, a capitalização das empresas, a modernização do Estado, e o reforço da coesão social e da igualdade. 
Acrescentamos nós: Honrar pai e mãe e seus legítimos superiores, não invocar a austeridade em vão, guardar domingos e feriados, em especial os repostos, não cobiçar as coisas alheias, não cobiçar a mulher do próximo, em especial se ela não quiser… 

      Acabar com as doutorices

A proposta de Paulo Rangel apresentada no Congresso do PSD foi a de que em documentos oficiais, actos públicos e instituições do Estado deixe de haver tratamento por doutores, engenheiros e arquitectos. Ora, dizemos nós, com o 25 de Abril, deu-se a transformação do chamado ensino, possibilitando aos filhos dos trabalhadores a igualdade de acederem às licenciaturas mandando às urtigas as escolas técnicas. Como valorização dos filhos do pessoal de trabalho, todos os licenciados passaram a designar-se doutores. Haverá agora aldeias onde há doutores casa sim, casa não, quem vai para baixo, em todas as casas, quem vem para cima. Ora, vamos agora acabar com esses estatutos tão popularmente conquistados?    


         Presidente em alta disponibilidade  

A anunciada (no dia 1 de Abril) presença do Presidente da República no Congresso da Sopa não se confirma, porque, sabe o Thomaropinião em primeira boca, que este alto dignitário já se tinha comprometido com a sua presença na sardinhada dos santos na Gualdim Pais. 


domingo, 10 de abril de 2016

TOMAR É O QUE?

António Lourenço dos Santos

A cidade já teve várias qualificações, que foram criadas para servir de mote a varias governações. Foram tentativas certamente bem-intencionadas de criar uma “marca”, que pudesse cunhar um desígnio para Tomar e imprimir um rumo ao desenvolvimento da cidade.
Recordamo-nos de 2 dessas marcas: Cidade Jardim e Cidade Templária. Que é feito delas?
A Cidade Jardim, apreciada à luz do presente, foi iniciativa falhada e infrutífera.
É que de jardins, estamos falados. Já houve, não há. Tivemos jardins-montra, jardins-lazer, jardins-convívio. Jardins de orgulho. Organizados, embelezados com flores, com arruamentos, ordenados e limpos. E havia jardineiros.
Hoje, há espaços desordenados-descuidados-degradados. O Mouchão, até tem uma picada por arruamento central. Espaços com erva onde já houve relva, restos de relva onde já houve flores, ferros onde já houve bancos, algazarras onde já houve musica, tendas onde já houve sombras, degradação onde já houve orgulho e harmonia. A Mata dos Sete Montes, um susto de degradação, por todo o lado. Uma ala central desprezada, arruamentos abandonados, floresta descuidada. Uma desilusão de desaproveitamento e de abandono.  O jardim da Várzea Pequena, sobrevive parcialmente, apesar de anémico. O da Praceta Raul Lopes, para fazer de conta. E outros…que mostram o falhanço do mote e a quase falência dos serviços municipais de parques e jardins. No presente, a originalidade é termos a tentativa de transferir os jardins para os passeios…

E a Cidade Templária, existe ou falhou também?
Desde logo, pouco se dá a conhecer, para alem de cruzes da Ordem de Cristo em bom tempo implantadas nalgumas calçadas, e de bandeiras hasteadas em tempo de qualquer festa. E do uso desordenado da “marca” e da cruz, aqui, ali e acolá, desde a pastelaria à agencia de viagens. Também temos uma festa-cortejo com arraiais e farturas à mistura, e benzedura do Vigário, e algumas Associações de extração recente, que reúnem publicas virtudes e vícios privados.
Um acervo monumental que vale por si, um legado histórico e cultural que adormece, uma implantação no território que está desaproveitada. Falta o Conceito, falta a Visão, falta a Competência.

Entretanto, estava esta Opinião em gesta, o Carlos Carvalheiro, (re)lança, ousado como é hábito, a Cidade Cultura. Desde logo, descanso porque esqueceu a sua original visão da Cidade jardim…
Ora bem, avança uma proposta (com 10 anos de idade…) que não é ousada, mas parece, que é muito sensata e que tem visão. Não é ousada apenas porque é natural. Na realidade, Tomar tem muitos elementos, específicos, que podem compor uma identidade completa e abrangente que tenha fundamento na Cultura. E que podem dar alma uma visão de desenvolvimento. Tomar desde sempre teve Cultura, desde os tempos da fundação do Castelo, da Charola e do Convento. E que Cultura! Boa ideia, esta, Cidade Cultural. Cultura abrangente, cultura criativa, cultura visionária. Realidade e Desejo, diz ele, o Carlos C.  Realidade que aspira por competência, digo eu. Utopia, seja. Aspiração, é.

Entretanto também, já surgiu uma quarta marca! E que confusão reina. Mesmo ao terminar deste apontamento, fomos surpreendidos com a criação ad hoc de mais uma marca para Tomar, a da “Feira da Laranja”. Esta, criada pela Senhora Diretora do Convento de Cristo, que afirmou, segundo consta da imprensa, que “este evento já é uma marca da cidade de Tomar…”. Está bonito…se a malta do vinho e do azeite se lembra…
Certo é que a cidade anda como um barco à deriva. Não está preparada para enfrentar ventos e tempestades, como bem se tem visto. O leme está desgovernado porque não tem rumo definido. Será esse o primeiro passo a dar para parar a deriva. Dar rumo. E desde logo, preparar a rota, renovar a frota, e organizar a equipagem.

quarta-feira, 6 de abril de 2016

PORTAGENS E INTERIORIDADES

António Lourenço dos Santos

Há interrogações que afligem cada vez que tenho que circular aqui no “Médio Tejo” por Auto Estradas, SCUT e vias do “género pago”. Eis algumas dessas interrogações, e algumas hipóteses de resposta:
Porque é que na A23 podemos transitar sem pagamento, entre Torres Novas e Entroncamento, entre o Entroncamento e Constância, e entre Constância/Montalvo e Abrantes?
ü  Porque as vulnerabilidades decorrentes da interioridade foram devidamente pensadas e combatidas.
ü  Porque a necessidade de facilitar a mobilidade entre localidades vizinhas foi reconhecida
ü  Porque as Autoridades locais quiseram e souberam intervir quando tiveram que o fazer, para assegurar equidade e para facilitar a vida aos habitantes.
Porque é que na A13 não podemos transitar sem pagamento, entre Entroncamento e Tomar, ou entre Asseiceira e Tomar, ou entre Santa Cita e Tomar, e entre Tomar e Ferreira do Zêzere, e nem sequer entre as 2 entradas/saídas para Tomar?
ü  Porque o Entroncamento, Tomar, e Ferreira do Zêzere, têm vista para o mar, e não têm, portanto, problemas de interioridade. Só os distraídos não vêm isso.
ü  Porque as populações do Entroncamento, de Tomar, e de Ferreira do Zêzere, não se querem relacionar entre si e preferem o isolacionismo.
ü  Porque as Autoridades locais estavam distraídas para intervir quando era oportuno, para assegurar equidade e para facilitar vida aos habitantes.
Porque é que aceitamos este estado de coisas?
Não sabemos. Mas ainda é tempo de intervir, por quem tem autoridade e condições para isso. Para facilitar a vida aos habitantes, para compensar os custos e inconvenientes da interioridade, e para facilitar a mobilidade local.
E Outras Questões:
ü  Será para chamar a atenção sobre os custos da interioridade e para dificultar a mobilidade, que somos castigados na A13 com preços de portagens dos mais elevados do País?
ü  E já agora, que é feito de certas promessas eleitorais recentes que garantiam a supressão de portagens no interior? Na A23 e na A13? Dissiparam-se nos corredores da AR? 
ü  E já agora, porque é que a A13 não tem nenhuma área de serviço com abastecimento de combustíveis, como estava previsto no contrato de concessão? Terá sido revisto? Ou a PPP meteu marcha à ré?   


segunda-feira, 4 de abril de 2016

ABRILADO ABALANÇAR

  Mário Cobra  

   Uma nesga de proximidade ao eventual leitor suscitou este pretensioso abrilado balanço (não autorizado) de um mês de existência do Thomaropinião, despique regado à mesa do petisco. Dirá de sua justeza o leitor mais cáustico, pois, conversa pífia, de engonhas, o petisco terá sido mesmo o ponto básico da ordem de trabalhos, partilha de ideias espera aí já perdem tempo com isso.  
     Mesmo assim, terá dito um participante dos cépticos que ainda não se encontra convencido dos blogues ofuscarem o aroma e ductilidade do papel/jornal (nem dará muito jeito levar o computador para a casa de banho, sala de leitura de quem assim obra. Obra lendo). Outro participante mais térreo disse acreditar no valor natural dos blogues como uma planta onde se podem colher frutos quase diariamente, necessitando para isso de cuidados constantes, como nas hortas se regam as novidades, mesmo opinativas. Sejam novidades da fava, da ervilha, do pepino ou do tomate. Outro participante assumiu quanto, mesmo escrevendo textos ditos “sérios” (não esquecendo que séria era nossa prima e foi o que viu), pois, mesmo assim, o entrelaço de opiniões o divertem à brava. Há pessoas de tal jaez, como há outras de diferentes quilates. Fica o registo de quanto a opinião pode ser um divertimento. Outro participante porque lhe dá jeito o bloguiano desabafo do momento, como alívio de bexiga, ou de paciência exaurida, já que, nos jornais, espaços disputados a peso de antiguidade ou estatuto, só se desafoga com data de sexta-feira, alvíssaras de distribuição à quinta, reflexo de quanto a notícia antes de o ser já o era. Outro participante assumiu ser detentor de talento para a piada, vulgo boca, fazendo mesmo um desenho para se fazer entender, mas o busílis reside no pormenor não despiciendo do jacto da verve demorar a aquecer os motores, muitas vezes só depois de muito bem regados…os motores. Outro participante lamentou a falta do imprescindível feedback, como se declamasse poemas do Bocage para uma plateia vazia. Para ele, escrever num blogue sem feedback será como comer frango assado sem picante. Outro participante admitiu que um blogue é o que cada um dos escreventes quiser que seja. Pois assim seja. Outro participante abordou a questão sempre lírica das motivações de quem escreve de forma constante num blogue: ou por interesse de promoção pessoal ou pela paixão pela escrita. Sendo que, tal como nos casamentos, se for por interesse certamente dura mais tempo. As paixões esgotam-se de forma mais rápida porque é da sua natureza, dá com força mas passa depressa.       
     Entrecruzaram-se falhas, omissões, quejandos e motivações. Uns porque prometeram participação asada e nunca sequer todavia contudo justificaram as faltas de comparência. São Relambório os castigue. Momento ainda para glosar um artefacto quando se constatou que um novo colaborador indicado por um dos bloguistas já se havia finado há uns meses. Oportunidade do Thomaropinião se promover a nível mundial e arredores caso o defunto, lá da esvaída bruma da eternidade, pudesse colaborar com  prosa digna de epifania “Convidado a participar no Thomaropinião, na qualidade de falecido posso testemunhar que o Paraíso existe, fica na Corredoura. Sinto saudades do café porque aqui nem o cheiro”. Outros porque os afazeres não lhes permitem, outros porque a sua vida não é esta, outros porque quem muito burros toca, todos ficam para depois (anda burro que amanhã é sábado). Outros porque torna, outro porque deixa…porque deixa andar.
     Por isso, em conclusão, deixa andar e logo se vê onde isto vai parar. Valha a verdade, o vinho branco animou o palato justificando a croniqueta ora escorrida.



domingo, 3 de abril de 2016

TENHO PENA, MAS TAMBÉM CULPA...

  Rui Ferreira

  Quando era criança acalentava, naturalmente, opiniões acerca das coisas do mundo.
  Lembro-me que uma delas era sobre os encostos de cabeça nos automóveis. Para mim, esses apêndices almofadados no topo dos assentos só poderiam servir para simular a presença de pessoas dentro do habitáculo, afastando os ladrões e garantindo assim a segurança dos veículos.
  Uma outra relacionava-se com a televisão: Eu afirmava a pés juntos que as motocicletas, mesmo passando ao longe, provocavam interferências na emissão e causavam uns riscos ondulados na imagem.
  Mas havia mais!... Ó se havia! No entanto, choques elétricos, cabeças partidas e outras experiências da vida, foram constituindo oportunidades para ajustar a minha opinião acerca de muitos assuntos. Em suma, o delicioso exercício da tentativa e erro, o doloroso raciocínio ou mesmo a pragmática aceitação da opinião de outros moldaram, e moldam, a minha “maneira de ver as coisas” 
  Hoje em dia, apesar de aturados cálculos e experiências, não tenho total certeza de que a luz do frigorífico se apaga quando fecho a porta. No entanto admiro todos aqueles que não têm dúvidas. De facto, tanto nas ciências exatas como a demografia, até às ciências humanas como a história ou a política, constato haver gente que não sofre de dúvidas. São cidadãos que atingiram o “olimpo da razão”.   
  Entretanto a “meia idade” tem-me possibilitado observar alguns fenómenos humanos cíclicos que radicam, não só na ignorância do percurso dos nossos antepassados, como também na falta de humildade que certos idealismos inflamam.
  Não querendo, de modo algum, concretizar a minha anterior afirmação, sinto simplesmente pena que, neste pequeno concelho, se vislumbrem tão poucos entendimentos.
  Li um livrito que acabava assim: “Uma vida de homem só se justifica pelo esforço, mesmo desafortunado, de melhor compreender. (…) Quanto mais eu compreendo, mais amo, pois tudo o que se compreende está certo”
Quão banal seria o mundo dos homens se todos tivessem o conhecimento e a consciência de tudo?



sexta-feira, 1 de abril de 2016

REFUGIADOS CÁ DENTRO

António Alexandre

  O Refugiados não vem para Portugal, é uma frase que me levou a olhar para este assunto de modo diferente do que a maioria, que preocupando-se com as dificuldades reais de incalculável número de pessoas desalojadas, pela guerra nos seus países, se esquecem que cá neste paraíso à beira mar plantado, existem na verdade muitos milhares de pessoas a viverem pior ou como os refugiados.
Nasceram em Portugal e sempre cá viveram,  em condições deploráveis, sem os mínimos de qualidade para viverem, nas margens da exclusão social e do próprio Estado. Sem as condições mínimas de vida, emprego, casa, luz, água, etc.
  Quando me deparei com a luta de uma mulher, que só pretendia ter luz eléctrica na sua casa e da restante família, julguei que com algum esforço da minha parte conseguisse ajudar a resolver essa questão, que me parece simples. Engano meu, passados vários meses nada acontece, só muros de surdos.
  O Estado faz vista grossa, entra a normal burocracia, que nos come impostos sendo da maior inutilidade e algumas outras entidades, fazem de conta que ajudam as pessoas, mas na verdade pouco mais fazem do que distribuir alimentos, que outros lhes  dão e as entregam para distribuir. . Existe muita insensibilidade nas organizações de assistências do estado, que as torna incapazes de ir mais longe e aos problemas.
  E muito faz de conta, que não vai ao fundo dos problemas e muito menos abre caminhos para as soluções e a dignidade das pessoas. As entidades vão fazendo vista grossa, sem irem no caminho das soluções, como é normal no Portugal real.
  Quando catorze cidadãos vivem na estrada de Bexiga Freguesia de Paialvo, concelho de Tomar, sem electricidade da EDP, mas conseguem ter dois contadores de água e pagar esses consumos todos os meses aos SMAS, quando os miúdos á noite para estudarem têm de o fazer a candeeiro a petróleo, não podem ter um frigorífico ou ver uma televisão, no ano de 2015, o que é isto senão refugiados portugueses a viver em Portugal.
  Quando uma mãe não consegue que um seu filho doente, tenha a devida medicamentação, porque não tem electricidade em casa, embora a queira pagar, como paga a água. O que é que esta gente pode pensar sobre o estado e o pais em que nasceu, em que muita gente se mobiliza para ajudar os outros, mas nada faz pelos que moram ao seu lado.
  Quando vejo e sobretudo oiço falar dos graves problemas dos refugiados e vejo tanta gente e bem, interessar-se pelos ajudar, interrogo-me, se os nossos concidadãos por estarem tão perto não merecem igual preocupação e ajuda. É muito faz de conta, esta sociedade portuguesa actual.
  Claro que só vejo uma forma de ajudar esta gente, é chamar a SIC a TVI e a RTP, talvez assim a solução apareça finalmente
 Talvez assim o sistema funcione e esta dúzia de cidadãos portugueses, deixem de ser refugiados na terra em que nasceram.